Assédio Moral no Ambiente de Trabalho

23/02/2015 08:17

Assédio Moral

Certamente muitos já ouviram falar sobre o tema. Contudo, ainda parece ser um assunto pouco abordado e quase nada difundido nas organizações.

Assédio Moral existe, muito provavelmente, desde o início das relações humanas. Mas foi somente na década de 1980 com os estudos sobre saúde e ambiente de trabalho realizados pelo Dr. Leymann (Alemanha) que houve o despertar para um melhor entendimento do que seria exatamente o problema. Os estudos seguiram pela década de 1990 – com ênfase para a identificação do fenômeno destrutivo no ambiente de trabalho fruto de dano psicológico. Inicialmente, o termo como o conhecemos hoje não era empregado. Primeiro foi classificado como mobbing, que significa agressividade animal, posteriormente passou a ser utilizado o termo de psicoterror, e somente com a publicação do primeiro livro, em 1999 escrito por Marie-France Hirigoyen (França), que o assunto passou a ser amplamente debatido em diversas esferas: universidades, sindicatos, empresas, níveis governamentais, entidades médicas, políticas, mídia ...

O foco desta abordagem está dirigido às instituições organizacionais, mais precisamente ao ambiente de trabalho, num contexto entre hierarquias e subordinações; ou seja, não é interesse aqui discutir assédio moral na sociedade como um todo.

Para que seja caracterizado como Assédio Moral é preciso que o agressor apresente uma conduta abusiva, intencional, frequente e repetida, que visa a diminuir, humilhar, vexar, constranger, desqualificar e demolir psiquicamente um indivíduo ou grupo, degradando suas condições de trabalho, atingindo a sua dignidade e comprometendo a sua integridade pessoal e profissional.

 Muitas vezes, num ambiente de rotinas organizacionais, podem ocorrer situações mais acaloradas e conflitos diários são normais e correntes. Uma observação mais ferina, nervosismo ou mau humor expressos por um profissional a outro(s), sobretudo se houver um posterior pedido de desculpas, não é considerado Assédio Moral.

Assédio Moral qualifica-se quando há esforço repetitivo e intencional de desqualificação!

 

 

São vários os tipos de manifestação por parte de um agressor que podem configurar Assédio Moral:

•       Desqualificar: não é uma agressão aberta, não permite réplica ou revide. Ex: suspiros, gestos de reprovação corporal, geração de dúvidas frequentes que colocam em questionamento a competência profissional. Piadas, brincadeiras, sarcasmo, ou mesmo ignorar a presença da pessoa. A vítima fica na dúvida se é brincadeira ou algo a mais.

•       Desacreditar: esforço em ridicularizar, humilhar e fazer a vítima perder a confiança em si. Difamação, calúnias, mentiras. A vítima fica deprimida e esgotada com o bombardeio de imagem negativa.

•       Isolar: quebrar todas as alianças. Deixar a vítimas mais frágil. Não convidar para reuniões formais e informais, privar de informações.

•       Constranger: atribuir tarefas inúteis e degradantes. Não valorizar as atividades, os trabalhos e a dedicação do profissional. Forçar Falhas: justificativa para o rebaixamento e degradação  da imagem do profissional.

•       Assediar Sexualmente: deve trazer explícita chantagem em demissão ou perda de benefícios. Não é cantada ou convite. É uma intimidação. Há punição à vítima caso o agressor não seja atendido! Deve-se reforçar que há uma clara diferença entre Conquistador/Sedutor e Assediador, isto porque  a sedução é um processo rico, envolvente, há um jogo de papéis, alimenta-se uma fantasia. Já o Assédio utiliza meios rasteiros, humor duvidoso e maldoso, propostas sujas. Necessita da estrutura de poder dentro da organização para sustentar e ameaçar o outro. Envolve tristeza, revolta e indignação para a vítima.

Assim, pode-se perceber a ocorrência de atitudes indevidas por parte do agressor quando há

Violência verbal - Comportamento sádico e desqualificativo - Rejeição afetiva - Exigências excessivas e desproporcionais - Ordens e cobranças contraditórias ou impossíveis – Chantagem.

 

 

Na maior parte dos casos o agressor escolhe suas vítimas entre profissionais mais tímidos, com menor exposição ao grupo e muitas vezes pertencentes a minorias (gênero - mulheres, raça - negros, orientação sexual - homossexuais, credo/religião). Ocorrem ainda com expatriados, isto porque trata-se de um indivíduo não pertencente ao grupo local, destoa dos demais, não compartilha da mesma cultura e passa a ser o alvo favorito do agressor por meio de piadas e brincadeiras indevidas com o objetivo maior de desqualificar e humilhar a vítima.

A forte incidência de Assédio moral se dá entre Superior como agressor sendo a vítima um Subordinado, em que o nível hierárquico passa a ser um fator de pressão já estabelecido pela chamada ordem natural dos fatos. Porém, existem casos de Assédio Moral entre pares, isto porque o agressor pode desejar se sobressair perante os demais, para conseguir uma promoção, ou mesmo para se ver livre daqueles que podem atrapalhar seu caminho... Usa de meios intencionais e frequentes para desqualificar, desacreditar e constranger um ou mais colegas de trabalho. Há uma forma menos comum, mas também passível de ocorrer Assédio Moral quando um Subordinado deseja derrubar um Superior – casos que envolvem expatriados, por exemplo, em que um subordinado local não entende a necessidade de trazer um profissional de fora para ocupar aqui o lugar de um profissional local, e há casos em que o subordinado local estabelece um clima de complô (grupo de profissionais locais) para difamar e desqualificar o expatriado.

Quando um profissional se torna vítima de um processo de Assédio Moral, passa a apresentar problemas com reflexos em diferentes instâncias, com graus que podem variar dos mais leves aos mais graves: desordem psiquica com consequências na vida profissional, social e familiar; há uma redução da capacidade de concentração nas tarefas o que pode levar a erros; começam problemas de saúde, que geram afastamento do trabalho, podendo acarretar na perda do emprego. Cria-se um forte sentimento de injustiça, a vítima não enxerga alternativas para reverter a situação e então recorre ao alcoolismo e drogas e em casos mais extremos, ao suicídio.

E quando uma vítima decide romper com o ciclo do Assédio Moral, o que fazer? Nas grandes organizações, em muitas multinacionais já existem procedimentos em que a vítima, ou um profissional que verifica a possibilidade de ocorrência de Assédio, realiza uma denûncia num canal de “linha direta com o RH” em que aponta fatos e situações que serão então averiguados por um comitê independente que tomará as devidas providências. E se nada for feito pela organização? Então a vítima deve reunir provas – que nos dias de hoje são muito mais fáceis de obter por meio de gravação por celular, trocas de emails e, então, denunciar à justiça. Mas, esta denúncia não irá recair ao agressor e sim à organização. E caso a justiça entenda que houve sim um problema de Assédio, quem deverá arcar com as indenizações será a organização.

Mas por quê? Simples, a justiça entende que todo o processo se desenvolveu em um ambiente institucional, num espaço em que as ações devem seguir uma cultura organizacional e as estruturas são estabelecidas pelos profissionais que lá atuam. Assim, quem deve estabelecer regras e aplicar limites é a organização. A organização deve ser a principal interessada em coibir problemas de Assédio, isto porque há um comprometimento em diversas vertentes: aumento de doenças e acidentes no trabalho o que pode levar a uma elevação do absenteísmo; há uma consequente queda de produtividade e desmotivação na área; piora a qualidade do clima organizacional o que pode acarretar em um aumento do turnover o que causa maior custo de reposição de profissionais; custos judiciais por indenização; há um abalo na imagem da organização e pode impactar até numa redução da atratividade de talentos.

Ou seja, quanto mais as organizações abordarem as temáticas de Assédio Moral em seus ambientes de trabalho, difundirem conhecimento, discutirem abertamente potenciais ações para endereçar maneiras de lidar com limites de abuso e envolverem todos os níveis hierárquicos, melhores serão as relações internas, e que poderão traduzir-se em benefícios para o clima organizacional com reflexos não só sociais como também econômicos.

A título ilustrativo, alguns filmes retratam de forma, por vezes exagerada, por vezes cômica, a relação de poder entre Superior e Subordinado que são fortemente enquadradas em vários dos pontos acima descritos, caracterizando Assédio Moral. Como sugestão: O Diabo veste Prada; Assédio Sexual; Como eliminar meu chefe 1.

Referência Bibliográfica:

 FREITAS, M. E. Assédio moral e assédio sexual: faces do poder perverso nas organizações. Revista de Administração de Empresa, v. 41, n.2, p. 8-19, Abr./Jun. 2001.

FREITAS, M. E. Quem paga a conta do Assédio Moral no trabalho? Revista de Administração de Empresa eletrônica, v. 6, n.1, Jan/Jun. 2007.

HELOANI, R.;  FREITAS, M. E.; BARRETO, M. M. S. Assédio Moral no Trabalho. São Paulo, Cengage, 2008.

Escrito por: Profa. Dra. Patricia C. Berardi – Professora do curso de Administração da ESPM, ministra disciplinas de Teoria das Organizações e Teoria Administrativa Crítica. Coordenadora do MBA de Estratégia para o Desenvolvimento Sustentável da FGV. Ministra diversos módulos de Sustentabilidade em MBA’s da FGV e da FIA.